Eu desliguei o celular ainda meio zonza, e vi que já estava atrasada para levantar e me arrumar para a escola. Calcei minhas pantufinhas de panda e antes que pudesse cobrir os pés por inteiro gemi com o frio do mundo fora de minhas cobertas. Apenas mais uma manhã de julho e provas finais. A ansiedade e angústia que escoltavam minha alma agora eram acompanhados de um buraco enorme no meu peito.
Ainda sufocada com a sensação vazia, me arrumei e tomei um café sem graça antes de sair. Minha mãe insistiu com uma carona, provavelmente notara a tensão do meu rosto e iria tentar tagarelar durante todo o caminho. Não tinha cabeça para tantas boas intenções, preferia caminhar com o vento frio batendo a face, eu poderia por alguns pensamentos em ordem.
O percurso breve me somou uma irritação muda pelo incômodo trazido pela enxurrada de perguntas de mamãe. Eu não sofria de amor, disse um milhão de vezes, minha amizade com Luiza anda as mil maravilhas, os estudos andam bem. Passei pela inquisição vitoriosa. O sorrisinho torto que dei convenceu-a que eu estava em ordem.
Desci do carro e respirei fundo, avistei Luiza e Pedro vindo em minha direção. A expectativa da prova de matemática nem os fez perceber alguma alteração em meu espírito, ou talvez eles não quisessem se importar com isso naquele momento. Subimos as escadas entre fórmulas aritméticas e estratégias de estudo utilizadas no fim de semana.
Os corredores exalavam um calor adolescente, bem diferente do ar gélido de fora. A falação dos meus melhores amigos agora me causavam inquietação. Logo me vi em meio a um grupo muito maior e mais ávido por informações. Desejei não ter estudado tanto no final de semana, seriam mais convincentes minhas desculpas por não conseguir resolver tantas dúvidas de última hora. Que aperto miserável em meu peito...
Boa aluna, boa filha. Família razoavelmente estruturada. Uma vida afetiva decadente, mas com umas poucas conquistas. Um futuro promissor. Ou talvez fosse isso que tanto me afligisse: o futuro. O porvir incógnito. Naquela manhã eu não desejava estar entre os viventes, não queria ter despertado do meu sono...
Precisava de direção, de instruções. Mas o que mais eu ansiava era por um motivo. Simplesmente uma tampa que escondesse o buraco do meu coração.
Sentei em minha carteira e falei com Ele. Disse meia dúzia de palavras e derramei uma lágrima no canto do olho esquerdo. Senti uma estranha sensação, senti vontade de viver aquele dia.
Desfrutei da paz. E nada mudou: minha relação com a minha mãe ainda precisava de ajustes, eu ainda não fizera minha escolha profissional e o menino dos meus sonhos ainda não me dissera bom dia.
Conclusão errada. Tudo mudara. Não vivera até hoje por essas coisas, mas por quem me faz atravessar todas estas em seus braços.
Muito bom, Monique!
ResponderExcluirMuito forte e verdadeiro. GOstei muito dessa frase em particular: "Não tinha cabeça para tantas boas intenções"
Arrasou!
Beijos
eu e essa minah mania de julgar um livro pela capa e os textos de blog pelo primeiro parágrafo. Achei que esse seria um texto chato, acho que por causa das "pantufinhas de penda", impliquei com isso.
ResponderExcluirMe identifiquei em tudo! A relação com a mãe, o impecável histórico escolar, a vida afetiva decadente (rs), o grande medo do futuro e a certeza de que se eu fraquejasse haveria uma mão amiga que não me deixaria cair.
Grande nostalgia. Hoje algumas coisas mudaram. Mas foi bom relembrá-las.
Obrigada pelo texto!
beijos
beijos